As compridas unhas pintadas perfeitamente de um vermelho sangue tocam a mesa de madeira criando um ritmo único combinado com as tantas pulseiras que rodeiam seu pulso.
Nem o perfume mais sofisticado consegue esconder o seu cheiro mais marcante: o de cigarro barato. E é exatamente isso que ela segura com a outra mão. Para algumas pessoas não há nada mais charmoso que se abanar com um leque em um dia quente. Mas nas mãos dela, é um cigarro que a transforma em uma figura icônica que só poderia ter saído de algum filme francês.
Eu a olho, admirada. O pouco que sei sobre ela, ouvi de outros. Ainda assim resolvi dar uma chance aos meus olhos… E também a minha alma. Já faz um tempo que sinto que o mundo está desmoronando a minha volta.
Ela acaba de revelar a terceira carta, das 8 que escolheu para mim. Vejo que sorri. Esqueço o que fui fazer ali e me perco tentando descobrir se aqueles dentes que me sorriem, ou melhor, que sorriem para o meu futuro, são verdadeiros ou dentadura. Lembro do meu avô e dos seus dentes repousando em um copo com água próximo da cama. Penso em tudo que poderia ter sido e não foi.
As unhas vermelho sangue pararam de bater na mesa de madeira, percebo. Minha última carta foi revelada. Ela traga seu cigarro com mais força, já não me parece tão mágica. Na verdade, ela me parece assustadora. A cada trago, uma fumaça no meu rosto. Me disse que é para me proteger do que as cartas querem me contar. Ela continua falando, mas só consigo ouvir os meus batimentos cardíacos. Tum tum tum TUM TUM.
A nuvem de fumaça vai aumentando até que me envolve por completo. Consigo encontrar e guardar comigo as minhas oito cartas, ainda não sei bem porquê o fiz. Levanto de um pulo, quero sair correndo. E saio. A perdi de vista, mas o som das unhas e das pulseiras batendo continuam.
Coloco as mãos no bolso do casaco. Meus dedos envolvem uma moeda no bolso onde deveriam estar as cartas. Eu sento, respiro e inspiro quantas vezes forem preciso para que me acalme, para que me concentre. Dou um beijo na moeda e volto a jogá-la para cima, rodando-a no ar na esperança de que eu volte a encontrá-la e que, dessa vez, eu consiga descobrir o que as cartas têm a me dizer.